O crime de Paulo Guedes destruindo a CEITEC, por Luis Nassif

No governo Sarney, Antonio Carlos Rego Gil, ex-presidente da IBM Brasil e, então, presidente da empresa de microcomputador da Sharp, conseguiu convencer Steve Job – recém demitido da Apple – a se instalar no Brasil. Fez um relatório com as condições (de trabalho) propostas por Job. E jamais obteve uma resposta.
Um dos maiores crimes contra o futuro foi cometido por Paulo Guedes, ao decretar o fim da CEITEC (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada).
Ela foi criada pelo ex-Ministro de Ciência e Tecnologia, Sérgio Rezende, visando preparar as bases para um polo tecnológico de microprocessadores.
Uma política industrial consequente teria as seguintes etapas:
1. A empresa adquirindo excelência tecnológica.
2. Transformada em grande fornecedora de chips para a área pública.
3. Conferir agilidade, ou através de PPPs (Parcerias Público Privadas) ou através de uma privatização tipo Embraer, com a empresa ganhando agilidade de mercado sem perder a condição de empresa estratégica.
Ficou apenas na primeira etapa. O grande cliente seria a Casa da Moeda, para a produção de passaportes. O passaporte é preparado por uma empresa privada, com chips importados. Houvesse vontade de governo, a CIATEC passaria a ser fornecedora, já que desenvolveu um chip para passaportes certificado internacionalmente.
Não ocorreu. A troca de governo, em 2010, não garantiu a continuidade do projeto. E a CIATEC passou a buscar mercado, mas da forma mais precária possível. Tornou-se fornecedora de pedágios eletrônicos, de sistemas de rotulagem.
Por ser empresa pública, os pesquisadores eram contratados com salários muito baixos. E o departamento comercial se limitava a um vendedor.
Mesmo assim, houve um esforço que permitiu um crescimento gradativo do faturamento, mas não a ponto de garantir a auto-suficiência.
Um estudo elaborado pela ACCEITEC (Associação dos Colaboradores da CEITEC) definia como meta a auto-suficiência financeira até 2024. E poderia ter se tornado peça chave no Plano Nacional de IoT (Internet das Coisas), montada pelo BNDES e pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, com suas verticais de Saúde e Agronegócio e, depois, com os desdobramentos em Defesa, Indústria e Logística avançada.
A partir do governo Temer, a empresa passou a ser sufocada por redução de verbas. Com Paulo Guedes veio o golpe final, simplesmente acabando com a empresa.
Ora, o valor de uma empresa de tecnologia depende do know how acumulado, do corpo de pesquisadores. O governo Bolsonaro simplesmente acabou com a empresa, dispersando os pesquisadores. Restou um prédio, apenas tijolos, para ser vendido.
A CEITEC nasceu como um movimento civil, através de uma ONG montada por pesquisadores ligadas às Universidades Federal do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina.
Quando constatou-se que a empresa seria destruída, e os pesquisadores dispersados, tendo que sair do país para trabalhar, a ACCEITEC (Associação dos Colaboradores da CEITEC) decidiu suprir a ausência de governo. Enviou propostas para várias empresas estrangeiras, mostrando a possibilidade de abrir uma filial em Porto Alegre para absorver os quadros da CEITEC.
Meia dúzia manifestou interesse e uma delas, inglesa, tomou a decisão de abrir a fábrica e contratar 10 dos pesquisadores. Outros … foram contratados pela empresa …
Ou seja, haveria amplo espaço para uma privatização que permitisse à CEITEC dar um salto, com transferência de tecnologia. Mas Guedes decidiu jogar tudo no lixo.
Mostra, mais uma vez, como historicamente o país foi jogando no lixo as principais ideias.
Nos anos 70, no início da era da expansão da computação, o IPEA (Instituto de Pesquisas Econômico Aplicadas) apresentou um estudo visando casar uma futura indústria de computação com um programa educacional personalizado. O trabalho foi do futuro grande cientista social Wanderley Guilherme dos Santos. Não foi adiante. Na década 2010 esse modelo pedagógico tornou-se sucesso nos Estados Unidos, a ponto da Fundação Lehmann apresentá-lo ao Ministério da Educação.
No governo Sarney, Antonio Carlos Rego Gil, ex-presidente da IBM Brasil e, então, presidente da empresa de microcomputador da Sharp, conseguiu convencer Steve Job – recém demitido da Apple – a se instalar no Brasil. Fez uym relatório com as condições (de trabalho) propostas por Job. E jamais obteve uma resposta.
A Secretaria Especial de Informática (SEI) criou um ambiente de enorme controle. Mas legou uma base tecnológica que poderia ter sido aprimorada com a abertura da economia. Tudo foi jogado fora.
De descontinuidade em descontinuidade, de despreparo a desprezo pela tecnologia, o Brasil vai destruindo, ano após ano, os caminhos do futuro.
Aqui, o debate da TV GGN.
Fonte: Jornal GGN
Foto: Reprodução