Para ex-chefe da Meta, respeitar direitos autorais ‘mataria a IA’

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A declaração expõe o conflito entre o lucro das big techs e o respeito aos direitos dos criadores no Reino Unido, levantando um alerta também para o Brasil
O ex-executivo da Meta e ex-vice-primeiro-ministro do Reino Unido, Nick Clegg, afirmou que solicitar permissões relativas a direitos autorais de artistas para treinar as aplicações de Inteligência Artificial (IA) poderia “matá-las do dia para a noite”. Ele fez a declaração durante o Festival de Charleston, onde divulgou seu novo livro, na tarde desta segunda-feira (26).
“Se você fizesse isso na Grã-Bretanha e ninguém mais fizesse, você basicamente acabaria com a indústria de IA neste país da noite para o dia”, afirmou Nick Clegg.
A declaração se deu após um questionamento sobre a regulação das IAs com foco nos direitos autorais dos artistas no Reino Unido, pauta que vem sendo discutida pelo Congresso britânico há algum tempo. “Creio que a comunidade criativa queira dar um passo além. Muitas vozes dizem: ‘Você só pode treinar com o meu conteúdo se perguntar primeiro’. E eu devo dizer que isso me parece um pouco implausível, porque esses sistemas treinam em vastas quantidades de dados”, afirmou Nick Clegg.
Big techs querem dados, mas não querem regras
A fala ocorre em um contexto no qual parlamentares britânicos discutem a regulamentação do uso de dados autorais por IAs. Entre as propostas em debate está o Projeto de Lei de Dados de Uso e Acesso, que visa proteger criadores e aumentar a transparência sobre quais obras estão sendo utilizadas no treinamento de algoritmos.
No entanto, ao rotular o pedido de consentimento como “inviável”, Clegg endossa a posição da indústria de tecnologia que busca se eximir de obrigações legais e éticas, especialmente no que diz respeito ao direito dos criadores de serem informados e compensados.
“Eu simplesmente não sei como você consegue perguntar a todo mundo primeiro. Simplesmente não consigo entender como isso funcionaria. E, a propósito, se você fizesse isso na Grã-Bretanha e ninguém mais fizesse, você basicamente acabaria com a indústria de IA neste país da noite para o dia”, completou.
Há diversos exemplos no cenário internacional de artistas que foram revividos ou plagiados. a voz do chef Anthony Bourdain foi recriada por IA em um documentário, já a empresa Respeecher recriou a voz icônica de James Earl Jones como Darth Vader, com autorização do ator. até mesmo Amy Winehouse, Freddie Mercury e Elvis Presley tiveram suas vozes postumamente geradas por IA – sendo Mercury o caso em que não houve aprovação legal dos herdeiros, principalmente por serem projetos experimentais. Veja mais sobre o assunto.
E a discussão dos direitos autorais no Brasil?
No Brasil, as IAs perpassam por diversos fatores legais quanto o assunto é arte, como o Direito da Personalidade, Direito Autoral e Direito Sucessório. Dessa forma, mesmo pessoas falecidas podem ter sua honra, imagem, voz e nome protegidos e, no caso dos artistas que sejam músicos, seus direitos estão protegidos por até 70 anos após seu falecimento – a menos que exista autorização dos herdeiros.
Ou seja, usar a voz de alguém — vivo ou morto — sem consentimento é ilegal e pode gerar processos por danos morais e patrimoniais. Assim, apesar de representar uma forma de preservar memórias e continuar o trabalho de artistas que perderam suas habilidades, discute-se ainda a autenticidade, consentimento e respeito ao legado.
Em território nacional, há um projeto de regulamentação das IAs, que ainda é discutido. Trata-se do Projeto de Lei (PL) 2338/2023, que estabelece um marco regulatório para desenvolver e usar os sistemas.
Fonte: Revista Fórum