Resgatando o Futuro: A Urgente Necessidade de uma Neoindustrialização Sustentável no Brasil
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É essencial que a reindustrialização seja orientada para a busca da sustentabilidade ambiental, buscando transformações produtivas.
A desindustrialização em curso no Brasil tem gerado crescente preocupação, sobretudo devido ao paradoxo de um aumento simultâneo das emissões de gases de efeito estufa e das mudanças climáticas. O país, outrora reconhecido por sua robusta base industrial, confronta-se com o desafio de harmonizar o crescimento econômico com a preservação ambiental. Neste artigo, analisaremos a importância da neoindustrialização como uma solução crucial para enfrentar os desafios climáticos atualmente colocados.
A reindustrialização sustentável emerge como uma resposta necessária e urgente diante do desafio de equilibrar a transição climática e a modernização da estrutura produtiva nos anos 2020. Essa reindustrialização não deve ser apenas focada no aumento da produção de bens tecnologicamente sofisticados, mas também deve atentar para processos eficientes do ponto de vista energético. Nesse contexto, é essencial que a reindustrialização seja orientada para a busca da sustentabilidade ambiental, buscando transformações produtivas que instalem um parque industrial capaz de contribuir para o crescimento econômico sustentável.
A desindustrialização é um fenômeno preocupante que ocorre quando a atividade industrial diminui em termos relativos em um país ou região específica. No caso do Brasil, essa tendência tem apresentado um paradoxo alarmante. Enquanto ocorre, as emissões de gases de efeito estufa têm aumentado. Essa realidade é profundamente problemática e exige uma mudança urgente de paradigmas. A falta de investimentos em tecnologia e inovação tem afetado negativamente a competitividade industrial do país, resultando em uma redução na produção manufatureira. Paralelamente, a excessiva dependência de setores menos comprometidos com a redução de carbono, como o agronegócio, tem contribuído para o aumento das emissões de gases de efeito estufa. É fundamental reverter essa tendência e promover uma nova indústria, sustentável e de baixa emissão de carbono, a fim de mitigar os impactos negativos das mudanças climáticas e garantir um futuro mais seguro e saudável para o Brasil e o mundo.
O Gráfico 1 mostra a composição de grandes setores de atividade no valor adicionado total em 1995 e 2022. Por esse recorte, fica evidente que os setores produtores de bens intensivos em recursos naturais – agropecuária e indústrias extrativas – foram os que ganharam maior peso relativo na estrutura produtiva (7 pp). Por outro lado, a indústria de transformação perde 4 pp de participação, sendo o grupamento com maior recuo.
Gráfico 1: Participação % de setores de atividade no Valor Adicionado (valores correntes) -1995 e 2022.
Em termos de composição das origens das emissões de 2014 a 2022, em todas as categorias a participação percentual decresceu, à exceção da Mudança de Uso da Terra e Florestas que passou a contribuir com quase a metade do total de CO2 em 2022.
Tabela 1: Participação e Crescimento em das Emissões de de CO2 (t) GWP-ARS-
2014 e 2021
Resíduos | Processos Industriais | Energia | Agropecuária | Mudança de Uso da Terra e Florestas | Total | |
Estrutura % | ||||||
2014 | 4,1 | 5,3 | 24,2 | 28,0 | 38,4 | 100,0 |
2021 | 3,8 | 4,5 | 17,9 | 24,8 | 49,0 | 100,0 |
crescimento médio em volume – % aa | ||||||
2014-2021 | 2,1 | 0,8 | -0,4 | 1,2 | 4,3 | 2,3 |
Fonte: Sistema de Estimativa de Emissão de Gases – SEEG, disponível em https://plataforma.seeg.eco.br/total_emission
Em suma, o baixo dinamismo da economia foi acompanhado, principalmente, pela expansão na emissão de CO2 pela mudança de uso da terra e florestas. A atividade agropecuária, que tem aumentado seu peso na matriz produtiva brasileira, desponta como o setor com maior contribuição negativa para a sustentabilidade do meio ambiente.
Diante do cenário alarmante em que a desindustrialização e o aumento das emissões de gases de efeito estufa têm se mostrado interligados, a implementação da neoindustrialização sustentável emerge como uma solução indispensável ao desenvolvimento do país. A neoindustrialização sustentável representa um processo que visa reconstruir uma base industrial robusta, enquanto se alinha com princípios e práticas sustentáveis fundamentais.
A fim de abordar os desafios da neoindustrialização, é fundamental adotar alguns pilares estratégicos. Um deles é o adensamento das cadeias produtivas das atividades agropecuárias e extrativas, promovendo vínculos produtivos para frente e para trás, a fim de aumentar o grau de processamento dos bens primários e conectar-se a outras indústrias que fornecem bens e serviços para esses setores. Além disso, é necessário buscar eficiência ambiental na exploração das atividades intensivas em recursos naturais, como a agropecuária, a exploração mineral e a extração e beneficiamento de petróleo.
Investimentos em mobilidade urbana podem servir como uma alavanca importante para a modernização da cadeia produtiva do setor automobilístico, enquanto a identificação da produção estratégica de insumos da área de saúde e militar pode contribuir para a segurança nacional. Promover a descarbonização dos processos industriais, visando a eficiência energética, e a integração da produção industrial com os serviços de TI para avançar em direção à indústria 4.0 são outros pilares fundamentais. Além disso, ampliar a produção de energia limpa é essencial para promover a transição para uma matriz energética mais sustentável.
Diante dos desafios dessa reindustrialização, é necessário estabelecer quais instrumentos de política seriam mais adequados. Além de apoiar-se em empresas estatais e bancos públicos, é fundamental expandir e diversificar o rol de políticas, desenvolvendo condicionalidades e vinculando-as ao compartilhamento de conhecimento.
Em termos práticos, propõe-se a implementação de um plano verde para a economia brasileira, que visa a modernização da indústria nacional, com compromisso ambiental. Cabe ao setor público sinalizar e apoiar financeiramente novos setores, enquanto o setor privado direciona seus investimentos produtivos em complementariedade, comprometendo-se a cumprir metas de descarbonização, modernização tecnológica e preservação ambiental. Nesse plano, os bancos de desenvolvimento desempenham um papel crucial no apoio à reindustrialização, assim como os projetos públicos de investimento em infraestrutura.
Em suma, a reindustrialização sustentável surge como uma estratégia fundamental para conciliar o desenvolvimento econômico com a proteção ambiental. Ao abordar os desafios da transição climática, a reindustrialização orientada para a sustentabilidade ambiental busca promover uma economia resiliente, inclusiva e de baixa emissão de carbono.
Carmem Feijo – Professora titular na Universidade Federal Fluminense (UFF), pesquisadora nível 1 do CNPQ e coordenadora do Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento – Finde/UFF
Fernanda Feil – Professora credenciada no Programa de Pós Graduação em economia da UFF e pesquisadora do Finde/UFF
Fernando Amorim Teixeira – Doutor em economia pela UFF, pesquisador Finde/UFF e membro do GT-Reindustrialização da REBRIP
Blog: Democracia e Economia – Desenvolvimento, Finanças e Política
O Grupo de Pesquisa em Financeirização e Desenvolvimento (FINDE) congrega pesquisadores de universidades e de outras instituições de pesquisa e ensino, interessados em discutir questões acadêmicas relacionadas ao avanço do processo de financeirização e seus impactos sobre o desenvolvimento socioeconômico das economias modernas. Twitter: @Finde_UFF
O Grupo de Estudos de Economia e Política (GEEP) do IESP/UERJ é formado por cientistas políticos e economistas. O grupo objetiva estimular o diálogo e interação entre Economia e Política, tanto na formulação teórica quanto na análise da realidade do Brasil e de outros países. Twitter: @Geep_iesp
O Núcleo de Estudos em Economia e Sociedade Brasileira (NEB) desenvolve estudos e pesquisas sobre economia brasileira, em seus diversos aspectos (histórico, político, macroeconômico, setorial, regional e internacional), sob a perspectiva da heterodoxia. O NEB compreende como heterodoxas as abordagens que rejeitam a hipótese segundo a qual o livre mercado proporciona a melhor forma possível de organização da economia e da sociedade.
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Fonte: Jornal GGN